O Queque de Campo de Ourique funciona como radar comunitário e tem ajudado o projeto RADAR a identificar casos de idosos isolados ou a necessitar de ajuda. Fomos conhecer quem adoça a boca e o coração das gentes do bairro.
Procuramos pelo nome e finalmente encontramos uma simpática montra, recheada de bolos que parecem chamar quem passa na rua. Já dentro do Queque de Campo de Ourique, Sandra e Paulo Gonçalves, proprietários deste estabelecimento que funciona como radar comunitário, dão-nos as boas-vindas, acompanhados já por Maria Mendes, mediadora do projeto RADAR.
O Queque associou-se ao projeto há alguns anos, ainda antes da pandemia, e a parceria começou a funcionar de imediato.
“O RADAR? Uma vez apareceram aqui e falámos sobre uma vizinha que tínhamos perto de nós. Estava extremamente deprimida, vivia sozinha. Volta e meia vinha aqui, conhecíamos a situação”, começa por contar Sandra, nascida e criada em Campo de Ourique.
Enquanto Paulo atende, ao balcão, os clientes que vão surgindo, a esposa conta-nos como o significado de radar comunitário “faz todo o sentido”.
“Acredito que haja mais casos que, infelizmente, não conhecemos. Mas àquelas que conhecemos estamos sempre atentos. No bairro as pessoas ainda olham umas pelas outras. Agora já há muita gente nova que tem uma vida a mil, mas ainda acontece”, assegura.
O facto de Sandra e Paulo ali terem o estabelecimento há já 15 anos contribui para notarem sempre que há algo fora do normal nos clientes com mais idade. Ou, simplesmente, para se terem tornado a companhia preferida – ou até a única – de alguns deles.
“Há pessoas que vêm cá e gostam de conversar e desabafar um bocadinho. Nota-se que querem falar. Na pandemia deixámos de ver muita gente e agora aparecem algumas pessoas muito mais debilitadas. Fecharam-se em casa, deixaram de ter aquela rotina e alguns já não recuperaram. Notámos isso. Mas agora já começam a sair”, explica Sandra.
A entreajuda existente nesta comunidade é algo que salta à vista, como os bolos caseiros da montra, e também ela adoça a vida daqueles que, já não bastassem as marcas da idade avançada, ainda vivem isolados.
“Temos, por exemplo, uma senhora que tem apoiado imenso uma vizinha sua, que também vive sozinha. Vai apoiando como pode e até desistiu de umas aulas que tinha na universidade sénior para tirar uns dias e vir com ela à rua. Portanto, ainda acredito que haja pessoas aqui no bairro que olham umas pelas outras”, acrescenta.
Missão de sucesso
Atenta à conversa está Maria Mendes, mediadora do projeto RADAR, que tem acompanhado o bom exemplo do Queque de Campo de Ourique.
“Os nossos radares comunitários são importantes para isto. Atualizam-nos sobre as situações das pessoas que estão mal, que faleceram, que foram para o lar, ou que precisam do apoio que podemos dar-lhes”, diz-nos.
Entre a conversa surgem exemplos de casos em que o radar comunitário cumpriu a sua missão, apesar da natural resistência inicial. Sobre um caso específico, Sandra Gonçalves relata a “trabalheira” que tiveram para convencer uma pessoa de que estaria melhor num centro comunitário e Maria Mendes corrobora: “Ouviu a voz de uma pessoa da freguesia e deste estabelecimento, do projeto RADAR, da filha e dos vizinhos e acabou por aceitar. E agora não quer outra coisa!”.
Em jeito de resumo, Sandra não tem dúvidas na hora de terminarmos a conversa.
“Acho que este projeto foi uma boa ideia”, garantiu, frisando que “no que puder ajudar”, o projeto RADAR pode contar com ela e com o marido. E os clientes terão sempre ali uma porta aberta, seja para pedirem ajuda, terem dois dedos de conversa ou simplesmente provarem um bolinho caseiro.